"Nilson Pimenta, tanto homem quanto artista, é pessoa
singular. Pinta o que sabe, viu e experimentou, portanto traduz um conhecimento vivencial. Daí
a sinceridade encantadora de suas telas narrativas da verdade de uma facção da sociedade brasileira: o
trabalhador rural, o roceiro e o peão. Esse homem esquecido do interior, brabo e surdo,
e suas duras lides. Homens cuja única riqueza são os seus braços que tiram do agreste da terra - que
não é sua - o seu minguado sustento e cujo único bem a perder são as suas resignadas vidas. Valiosos
construtores que nada sabem de suas valias.
Nilson foi desses homens e, se preciso for, o será novamente, pois diligências não lhe falta. Baiano
de nascimento, saiu de lá ainda nos braços rumo a Prata dos Baianos, no Espírito Santo, e com seis
anos de idade dava com os costados no leste do Mato Grosso. Os campos de Barra do Garças, Brasilândia,
Finca-Faca, Irenópolis e Jacira o viram crescer plantando arroz, feijão, milho, amendoim em terra de
toco, isto é, apenas derrubada e não mecanizada, Um ou dois anos depois da mata derrubada e feita a
primeira e precária colheita, essas terras arredondadas eram entregues para o dono, já beneficiava
pelo seu suor. Mudanças. Outros municípios, novos ranchos. Taperas guardam mimos e abandonos, vestígios
da breve morada do roceiro nômada que não consegue se enraizar.
Nessas andanças, à procura de novos alqueires para plantar e novas empreitadas a enfreitar, fossem matas
para derrubar, campos para limpar, cercas para esticar ou cana para cotar, Nilson se fez homem e formou
sua memória. Para retê-la, rabiscava num papel qualquer, carteira de cigarro vazia. Com pedaços de carvão
desenhava numa cancela, com gravetos riscava o chão ou com os dedos deixava marcas na porira da letral
de algum automóvel. Os primeiros desenhos em papel fez com um lápis de cor, em 1979, já em Cuiabá, expulso do campo devido à má sorte com os roçados. Durante esse ano foi guarda do campo de vigilante (Cormat). Como o serviço era pouco, ficava só com aquele revolvão na cintura, ele rememorava visualizando no lápis e no papel o seu recente passado que colocara à margem dos seus afazeres."
Aline Figueiredo