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A Letra Descalça

niilirismo

É fácil confessar: i Claro, te quero.
O sobressalto desse teu sorriso.
Extravagantes luas exorbitam.


postal

Colhi densos amarelos,
fiz maldade com os gatos,
dei formicida às bonecas.
Algodão já não bastava
para beber tanto choro,
o sal subindo nas línguas,
o mar não contendo estátuas,
fogo, fogo, me dizendo
cada notícia engolida.
Brancas foram as histórias,
o rio sem pombas: azul
de veias leguminosas.
Movimentos entre os peixes.
QUE SEJA BOA NOTÍCIA.
Teus olhos nadam no riso.
(Chegue, chegue, meu navio.)


senha

- Abra, bradava!
Pode a palavra?
Abra cada. Abra
esses estojos
invioláveis
(não dirão nada).
Branco segredo
tão pronunciado
na concha brava.
Vulcão extinto?
Lívida lava
que deslumbrava?
Palavra dada?
Peço a palavra?
Maga palhaça
que se disfarça
de deslembrada.
Abra! Bradava.


isto

Veremos o que resta,
menos isto.
Seremos o que dista
menos disto.
Teremos a distância
e seu registro
retido como marca.
Manso? Arisco.
Sinal que colhe o olho
quando pisca.
A pálpebra veloz,
oportunista.
Veremos o que resta
ou sua pista.

Queremos o que basta
e que resista.


soneto

É de cantar que se desiste e nega
em algum canto " assim pequeno e único "
e defendido por paredes muros
de um coração maduro, duro e puro:
de um coração, couraça do futuro,
negando espaço às margens do soluço
onde nem cabem essas amizades
nem haverá chorar por nenhum furo.
A força de recusa, sóbrio abuso
de todos os limites que se usam,
ninguém dará lugar à dor intrusa
que ficará doendo lá na rua

como algo que só dói, obsoleto,
por não caber nas formas de um...


branco

Este poema me mandou calar.
Intercalada voz esvaziei.
Era certeira vez uma avestruz
metida no orifício do talvez.

O verso dava a volta, circular.
Seu vício é repetir o que não diz.
O branco era veloz,
na página, imortal, pedindo bis.

Banhada por um sol gramatical,
a fala articulada e este vazio.
Seu único roteiro: resvalar
pelo redemoinho de um funil.

Pingaste no papel, ponto final.
A ponta da caneta te esqueceu.
Sinal, deixo-te só
retido na retina de quem leu.

capa Takashi Fukushima
editora Brasiliense
ano 1985








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